Existe um ponto comum que une o Poder Judiciário e os tradutores juramentados. Esse ponto muito importante é a verdade.
Quando o tradutor público apresenta para a sociedade uma tradução juramentada, ela está revestida de uma verdade inconteste, pelo princípio da fé pública que garante a esse documento a veracidade, a oficialidade e a fidedignidade.
O Judiciário, por sua vez, é um eterno perseguidor da verdade. Da verdade processual, da verdade possível.
Nesse ponto devem se juntar Poder Judiciário e Tradutor Público. Quando o tradutor juramentado apresenta ao Poder Judiciário uma tradução pública, não pairam dúvidas. O que é dito ali é uma verdade. Não há dúvidas para o juiz, os advogados não têm dúvida, as partes não têm dúvida.
E isso é diferente de qualquer outro documento que possa ser apresentado em um litígio. Os documentos comuns, que não têm fé pública, podem ser contestados de acordo com o interesse das partes. Porém, quando é apresentada uma tradução juramentada: há um silêncio na plateia! Chegou o texto do tradutor público. Chegou a verdade!
Este é o relevante serviço prestado pelo tradutor público: oferecer um texto pautado na verdade.
Para cumprir suas funções, muitas vezes, o juiz conta com a colaboração dos auxiliares da justiça. E aí estão os tradutores, no rol exemplificativo do art. 149 do atual código de processo civil, Lei Ordinária nº 13.105/2015, que traz a seguinte redação:
Art. 149. São auxiliares da Justiça, além de outros cujas atribuições sejam determinadas pelas normas de organização judiciária, o escrivão, o chefe de secretaria, o oficial de justiça, o perito, o depositário, o administrador, o intérprete, o tradutor, o mediador, o conciliador judicial, o partidor, o distribuidor, o contabilista e o regulador de avarias.
É importante sinalizar que o tradutor público não se enquadra na categoria “Peritos”. Tradutores e peritos são agentes diferentes. A principal diferença é que o perito coleta dados, faz relatórios. Ele dá sua opinião, interpreta e emite um parecer. O tradutor, por sua vez, não faz nada disso. Ele simplesmente traduz. Ele não pode colocar juízo de valor na sua tradução. Tem que dar fé de que o que está ali é verdadeiro; tem que certificar a fidedignidade do texto traduzido. O tradutor juramentado expede uma certidão de tradução pública e essa tradução não pode ser contestada pelas partes.
Outra diferença entre tradutores públicos e peritos é a questão do pagamento. Estes se submetem à tabela da justiça, enquanto aqueles, por sua vez, recebem seus emolumentos fixados por uma tabela, prevista em lei federal e determinada pela Junta Comercial.
A questão do pagamento dos emolumentos em um processo jurídico tem suscitado um hiato entre o Judiciário e os tradutores públicos, notadamente, pela tabela da Justiça que os juízes querem que os tradutores cumpram caso aceitem a nomeação para atuar em um determinado processo. O tradutor público que aceita trabalhar recebendo pela tabela da Justiça está desobedecendo a lei que rege seu ofício de tradutor.
O artigo 35 do Decreto 13.609/1943 determina que os emolumentos devem ser fixados em uma tabela organizada pela Junta Comercial do Estado e, em seu parágrafo único, há uma proibição expressa quanto à concessão de descontos a quem quer que seja, inclusive ao Poder Judiciário, sob pena de perda do título.
Se um juiz impõe ao tradutor juramentado aceitar uma tabela diferente daquela prevista em lei federal, parece haver um contrassenso, porque, de certo modo, os tradutores são impelidos a descumprirem a lei que rege seu ofício. Como um juiz determina que um cidadão descumpra uma lei? É importante resolver esse impasse.
A questão da aplicação da tabela da Justiça tem sido o principal motivo pelo qual os tradutores juramentados não têm aceitado as traduções do Poder Judiciário. Claro que existe interesse de parte dos tradutores de realizarem essas traduções. Todos querem trabalhar e precisam! Mas querem trabalhar dentro da legalidade, obedecendo à tabela da Junta Comercial.
Muitas vezes os tradutores são intimados a realizarem traduções para a justiça gratuita. É certo que os tradutores públicos e intérpretes comerciais ao realizarem suas traduções têm sua parcela de função social, uma vez que, sob o novo marco jurídico do Código Civil de 2002, não se pode fugir dessa limitação, quer seja nos negócios jurídicos em geral, quer seja no direito de propriedade. Não menos verdade, no entanto, é que, ao exercerem seu múnus, fazem-no com autonomia e obedecendo a requerimentos pré-estabelecidos, inclusive no tocante aos emolumentos. Se não lhes é permitido cobrar além da tabela imposta pelo Estado, não lhes pode ser exigido o contrário. É o que se pode concluir pelo princípio do tratamento isonômico.
Não se pode onerar os tradutores, impondo-lhes a obrigatoriedade da realização de traduções ou diligências judiciais com todas as obrigações acessórias daí decorrentes (participação em audiências, cumprimentos de prazos processuais, prestação de esclarecimentos, manutenção de registro em livros, guarda dos respectivos livros de forma vitalícia etc.), sem a contraprestação correspondente, sob o argumento, muitas vezes simplista e costumeiro, de falta de orçamento do Poder Judiciário ou do Órgão Administrativo. Além disso, muitas vezes, há casos de tradutores públicos que se queixam da demora e da dificuldade para receber seu pagamento, que às vezes tardam anos.
Os tradutores têm interesse em serem nomeados e atuar ativamente em parceria com o Tribunal de Justiça, desde que se respeite a tabela de emolumentos. Poder Judiciário e tradutores públicos devem se aproximarem de modo que a sociedade seja bem atendida. Uma boa relação com o Judiciário permitirá que todas as rogatórias e peças processuais sejam traduzidas, fazendo surtir os efeitos jurídicos necessários para bem atender à sociedade.